Justiça da Argentina condena 'Anjo da Morte' e outros 11 repressores da ditadura à prisão perpétua

31/10/2011 15:03

Mais uma vez, a Argentina faz História. Mais uma vez, o Brasil adormece perante ela, deitado eternamente em berço esplêndido.

Ivan

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Todos agiram na ESMA (Escola de Mecânica da Armada), maior centro clandestino de prisão do país

 

Fonte: Efe

Centenas de pessoas se reuniram em frente ao tribunal, em Buenos Aires, para ouvir as sentenças

“Prisão comum, perpétua e efetiva, nenhum só genocida nas ruas da Argentina!”, exigem em uma canção ativistas de Direitos Humanos a cada protesto, julgamento ou homenagem às vítimas da ditadura militar do país (1976-1983), que deixou um saldo estimado de 30 mil mortos e desaparecidos.

Na noite desta quarta-feira (26/10), parte da demanda foi atendida pela Justiça argentina: mais 12 repressores foram condenados à prisão perpétua pelo sequestro, tortura e assassinato de 86 pessoas na ESMA (Escola de Mecânica da Armada), maior centro clandestino de prisão do país. Outros quatro condenados receberam penas de 18 a 25 anos e dois dos réus foram absolvidos, mas continuarão presos à espera de mais julgamentos.

A investigação sobre os crimes cometidos na ESMA foi aberta nos anos 1980, após a redemocratização do país. O  inquérito foi depois arquivado com as leis do Ponto Final (1986) e da Obediência Devida (1987). A ESMA é um dos símbolos do terror vivido no país durante o regime imposto após o golpe de Estado contra María Estela Martínez de Perón, no dia 24 de março de 1976.


Muitos carregavam cartazes com o rosto do jornalista argentino Rodolfo Walsh, assassinado pela ditadura

Estima-se que cinco mil pessoas tenham passado por esta centro prisional clandestino, e que apenas cerca de 100 tenham sobrevivido. O primeiro julgamento dos crimes cometidos, concluído nesta quarta, durou mais de 20 meses e contou com os depoimentos de mais de 250 testemunhas. Por determinação do ex-presidente Néstor Kirchner, a ESMA foi transformada em um "centro cultural e de memória".

A sessão começou com cerca de uma hora e meia de atraso. No tribunal, sobreviventes e familiares de vítimas se sentaram a pouca distância dos réus. Do lado de fora, centenas de ativistas acompanharam a leitura das sentenças, celebrando com lágrimas e sorrisos cada pena perpétua ditada. Cada vez que o juiz lia o nome de algum dos repressores, a multidão na rua gritava “assassino!”, e quando nomeava alguma vítima, a resposta era “presente!”

'Anjo da Morte'

A comemoração mais intensa da noite foi durante a sentença de Alfredo Astiz. Condenado à prisão perpétua, o então capitão de fragata se infiltrou entre familiares de desaparecidos para identificá-los, e foi o responsável pela morte de Azucena Villaflor, Esther Ballestrino e María Ponce, fundadoras da organização Mães da Praça de Maio. Outras de suas vítimas foram as freiras francesas Alice Domon e Leónie Duquet, assassinatos pelo qual a França chegou a pedir sua extradição.



Além de Alfredo Astiz, ex-militares como Ricardo Cavallo, Jorge Acosta e outros 15 acusados ouviram suas sentenças

Sem mostrar arrependimento pelos crimes cometidos na época, o também conhecido como “Anjo da Morte” chegou a dizer em entrevista a uma revista argentina que foi “treinado para matar”. Ao escutar sua sentença, Astiz colocou uma bandeira argentina na aba do paletó e sorriu ironicamente. A reação dos que acompanhavam o julgamento na rua, por meio de um telão, foi de indignação. Não à toa, aplaudiram efusivamente ao escutar a palavra “perpétua” em sua pena e gritaram tudo o que puderam. Dentro do tribunal, o juiz ameaçou esvaziar a sala, caso os presentes não se mantivessem em silêncio.

Rodolfo Walsh

Outro assassinato conhecido do processo foi o de Rodolfo Walsh, autor de Operação Massacre. Baleado no centro de Buenos Aires, o escritor e jornalista teve seu corpo desaparecidos pelos responsáveis do assassinato. Por esta razão, pela primeira vez, uma sentença foi ditada somente com base em depoimentos de testemunhas, que chegaram a ver o cadáver na ESMA. Pela morte de Walsh foram condenados Alfredo Astiz, Jorge "Tigre" Acosta, Ricardo Cavallo, Radice, Ernesto Weber,  Juan Carlos Fotea e Antonio "Rata" Pernías, Jorge Carlos "Ruger" Radice.

A felicidade pela aplicação da justiça, esperada há mais de 30 anos por parentes dos desaparecidos, levou que uma multidão dançasse, em ciranda, do lado de fora do Tribunal, cantando: “Apesar das bombas, dos fuzilamentos, dos companheiros mortos, dos desaparecidos, não nos venceram!"